Uma das áreas vinícolas mais antigas da Europa, o Douro produz vinhos há pelo menos 2 mil anos. No entanto, foram encontrados na região vestígios de lagares e vasilhames para vinhos do século III, chegando mesmo a estimar-se que a presença da uva na região remonta há cerca de 4 mil anos.
Famosa pela elaboração do vinho do Porto, esta região tem dado origem a vinhos tintos – e até alguns brancos – fantásticos, que vêm chamando a atenção pelo mundo afora. Extremamente potentes, encorpados e concentrados, mas ao mesmo tempo classudos e elegantes, são vinhos que podem ser guardados por anos e anos até serem apreciados.
Localizada no nordeste de Portugal e próxima ao rio Douro, a região também se destaca por possuir o clima ideal para o cultivo de inúmeras variedades de uva, pois seus morros protegem os vinhedos dos fortes ventos.
História escrita pelos seus vinhos
Muito antes de qualquer presidente, rei ou imperador, o Douro era uma terra sem governo, habitada por povos primitivos, os primeiros a deixar seus vestígios na região. As pinturas rupestres do Vale do Côa são do período Paleolítico, há cerca de 20 mil anos. A presença da uva no Douro remonta há 4 mil anos (século XX a.C.), tendo sido encontradas sementes de uvas carbonizadas em estações arqueológicas da região. Muitas das ruínas pré-romanas, como o Castro de Cidadelhe, em Mesão Frio, datam dessa época.
Com a chegada dos romanos, no século I d.C., a agricultura intensificou-se, algo possibilitado pela rede de estradas e pelas numerosas pontes que o Império construiu. A uva começou a adquirir maior importância, existindo vilas agrárias dedicadas exclusivamente à produção de vinho, como foi comprovado na estação arqueológica do Alto da Fonte do Milho, no Peso da Régua.
A região continuou sendo ocupada continuamente. A partir do século V as terras do Douro foram os suevos e visigodos, que acabaram por se unir e cristianizar. Seguiram-se então os muçulmanos, depois do século VIII. Isso só deixou de acontecer após a implantação do reino português, a 5 de outubro de 1143 pelo Tratado de Zamora, quando iniciou-se a construção da Sé de Lamego, sob a proteção de D. Afonso Henriques (1109-1185), o primeiro rei português, responsável pela independência deste país.
No século XIII, com a prosperidade comercial e econômica e ao transporte para o Porto através do rio Douro, a produção destes néctares continuou a se desenvolver. Em seguida veio o período das descobertas marítimas (séculos XV e XVI) e houve um aumento da circulação no rio, uma vez que as viagens requeriam grandes quantidades de vinhos fortes para saciar os marinheiros.
Entre os séculos XVII e XIX, a Inglaterra passa a ser o principal consumidor dos vinhos produzidos no Douro, o que resultou na assinatura do Tratado de Methuen, em 1703. Nesse tratado, o Reino Unido concedia direitos preferenciais aos vinhos portugueses, com a contrapartida de Portugal permitir a entrada livre dos tecidos britânicos no mercado nacional.
Estimulada pela procura inglesa crescente e preços altíssimos, a produção do Douro tenta se adaptar às novas exigências do mercado. Mas, como acontece sempre que a demanda é muito grande, o negócio rivaliza interesses, suscita fraudes e abusos. A qualidade dos vinhos cai por conta de misturas inadequadas. Assim, a partir de meados do século XVIII as exportações estagnam, enquanto a produção continua a crescer. Os preços caem e os ingleses decidem não mais comprar vinhos, acusando os produtores de promover adulterações.
Esta crise comercial conduzirá, por pressão dos interesses dos grandes vinhateiros do Douro junto ao governo do futuro Marquês de Pombal, à instituição da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro, em 10 de Setembro de 1756. Com ela busca-se assegurar a qualidade do produto, evitando adulterações, equilibrar a produção e o comércio e estabilizar os preços. Também nesta época acontece a demarcação de terras, criando-se a primeira região vinícola regulamentada do mundo. O Douro Vinhateiro é demarcado por 335 marcos de granito com a designação de Feitoria, designação que referendava o vinho da melhor qualidade, único que podia ser exportado para Inglaterra.
O século XIX, no Douro, foi marcado pelas doenças que se abateram sobre as vinhas, como o oídio e a filoxera, contribuindo para o desenvolvimento da viticultura na região, devido a inovações biológicas e químicas, como forma de evitar essas doenças. Ainda no mesmo século, iniciou-se a construção das linhas ferroviárias, que facilitaram a ligação entre o Porto e a fronteira da Espanha.
A paisagem atual da região do Douro, caracterizada pelos socalcos (plataformas cortadas nos morros), foi construída durante a década de 70, com a aplicação de novas técnicas de plantio da vinha, em patamares, com muros de xisto delimitando cada nível. Esta alteração da paisagem pela atividade humana contribuiu para que o Alto Douro Vinhateiro fosse considerado Patrimônio Mundial da Humanidade, pela UNESCO, em 2001.
Como é a viticultura na região do Douro
O Douro possui solos ricos em nutrientes e compostos de rochas metamórficas laminadas (xisto), perfeitos para o plantio de Touriga Nacional, Tinta Roriz, Tinta Cão e Tinta Barroca, as castas emblemáticas da região. As uvas tintas recebem uma condição excelente de cultivo, uma vez que o solo retém água, moderando a umidade e controlando o rendimento das castas.
Para a instalação das vinhas na região foram empregadas técnicas de armação do terreno em socalcos nas áreas de maiores declives. Essa forma de condução foi a solução encontrada para ajustar a influência do clima e do solo às necessidades da planta e aos objetivos de produção.
Rodeada por cadeias de montanhas, a região portuguesa possui um clima rigoroso, com verões bastante secos e quentes e invernos extremamente rígidos. Com mais de 250 mil hectares de vinhedos, a região do Douro é dividida em três sub-regiões: Baixo Corgo, Douro Superior e Cima Corgo.
O Baixo-Corgo encontra-se ao extremo oeste do Douro, com a presença intensa de chuvas e elevado rendimento de castas, pois 29,9% das plantações são destinadas aos vinhedos. Já o Douro Superior, sub-região localizada no extremo leste do Douro, apresenta um clima mais seco e é a fonte dos melhores vinhos do Porto Vintage.
A terceira sub-região, o Cima Corgo, localiza-se a meio leste do Douro, e apresenta clima predominantemente seco, resultando em uvas de menor rendimento. Apesar disso, as melhores vinhas da região do Douro encontram-se nesta sub-região, justamente pela aposta na elaboração de vinhos mais concentrados e com maior potencial de envelhecimento.
A cultura da vinha, na maioria dos casos, coexiste com amendoeiras e oliveiras na beira das parcelas.
As castas do Douro
A grande diversidade de castas existentes no Douro, adaptáveis a diferentes situações de clima, demonstra as excelentes condições para a cultura da vinha existentes na região. Portugal é um dos países do mundo com maior quantidade de castas autóctones (nativas) e, dentro de Portugal, o Douro é a região com maior diversidade.
São uvas que só se encontram em território português – pelo menos com os nomes que ali recebem. Entre as tintas, destacam-se Tinta Amarela, Tinta Barroca, Tinta Roriz, Touriga Francesa, Touriga Nacional (a uva emblemática de Portugal) e Tinto Cão. As castas brancas predominantes são Malvasia Fina, Viosinho, Donzelinho e Gouveio.
Vinhos potentes e elegantes
No Douro ainda se produz vinhos de duas maneiras distintas. A tradicional, elaborada em lagar – recipiente de pedra largo e pouco profundo – produz vinhos com cor e taninos acentuados, o que lhes confere, de forma geral, bom potencial de envelhecimento. O método mais moderno utiliza cubas de inox com controle de temperatura, produzindo vinhos mais elegantes e com aromas melhor preservados. Há produtores que, para atingirem maior complexidade, usam ambos os métodos de vinificação.
Tem-se verificado também uma evolução na forma de maturação do vinho antes deste ser engarrafado. Tradicionalmente utilizavam-se grandes vasilhas de madeira usada, recipientes que estão sendo, gradualmente, substituídos por barricas novos de carvalho, ou então por cubas em inox.
Vinhos Tintos
São vinhos produzidos a partir de castas autóctones, como Touriga Nacional, Touriga Franca, Tinta Roriz (Aragonez), Tinta Barroca e Tinto Cão. A grande maioria resulta de um blend de várias castas, com uma complexidade e riqueza ímpares, que lhes imprimem um perfil característico do Douro. Existem também bons exemplos de vinhos varietais, produzidos apenas com uma casta, principalmente das três primeiras.
Tintos para consumir jovens
A maioria apresenta uma cor rubi e aromas de frutas vermelhas, como framboesas e morangos, que podem ser complementadas por notas florais e de madeira. Têm corpo médio e adstringência equilibrada. Os Douro jovens serão apreciados em todo o seu esplendor se consumidos nos primeiros anos após a vindima.
Entre estes vinhos encontram-se os tintos mais adequados para acompanhar pizzas, massas, bacalhau ou pratos de carne pouco elaborados. Devem ser servidos entre os 13º e os 15 ºC.
Tintos de guarda
Têm boa profundidade de cor e aromas complexos e intensos. Quando novos, é comum surgirem notas de frutas negras, chocolate, balsâmicas, violeta e madeira, sendo vinhos de grande estrutura e com taninos persistentes. No seu apogeu, que pode levar quase uma década, apresentam aromas delicados e sutis, mas de grande complexidade. Na boca o vinho amacia, mas mantém-se equilibrado. Uma parte significativa dos vinhos de guarda produzidos no Douro apresenta no rótulo a designação Reserva ou Grande Reserva.
Quando novos harmonizam bem com pratos de carne vermelha, como um Ancho ou carne assada com condimentos fortes. Também combinam com alguns pratos da cozinha tradicional portuguesa, como cabrito assado ou vitela. Quando envelhecidos são recomendados para acompanhar pratos de caça. Devem ser servidos entre os 16º e os 18 ºC.
Vinhos Brancos
No Douro existem grandes vinhos brancos para serem descobertos. Os vinhos secos são produzidos a partir de blend de várias castas, como a Malvasia Fina, o Viosinho, o Gouveio e o Rabigato.
Brancos para consumir jovens
De cor pálida, com refrescantes aromas de fruta cítricas e florais. Na boca são equilibrados, mostrando a sua juventude. São um bom acompanhamento de pratos de peixe e saladas, podendo também ser bebidos como aperitivos. Devem ser consumidos a uma temperatura entre os 8º e os 10 ºC.
Apresentam boa intensidade aromática e boa complexidade e geralmente fermentam ou estagiam em madeira, apresentando nesses casos uma cor dourada e aromas tostados e de fruta tropical. No palato são cheios e persistentes. Acompanham bem pratos de peixe gordo, como salmão ou bacalhau, podendo também ser servidos com frango ou coelho acompanhados de molhos suaves. A maioria destes vinhos ostenta a designação Reserva e Grande Reserva e devem ser servidos a uma temperatura por volta de 12ºC. Podem ser guardados por alguns anos antes de serem consumidos.
Vinhos Rosados (ou Rosés)
Acompanhando a tendência de consumo mundial, a região do Douro tem visto nascer um número cada vez maior de vinhos rosados. Estes vinhos, produzidos a partir de uma maceração ligeira de uvas tintas, apresentam uma bela cor rosada e exuberantes aromas jovens de framboesa e cereja. Na boca, conquistam pela sua suavidade, doçura e acidez.
São ótima companhia para um aperitivo no verão, e harmonizam perfeitamente com a gastronomia oriental, como a japonesa (sushi), indiana ou do sudeste asiático (tailandesa e vietnamita). Devem ser consumidos enquanto jovens (1 a 2 anos) e servidos ligeiramente frescos, entre 10º e 12º C.
Outros vinhos do Douro
Com menos expressão dos que os demais vinhos, podemos ainda encontrar, sobretudo nas áreas mais altas, vinhos com características particulares como o Moscatel do Douro, o espumante do Douro e vinho novo (vinho da última vindima), bem como o Colheita Tardia, elaborado com uvas em sobrematuração por ação da podridão nobre.
Vinho do Porto: sinônimo do Douro
A bebida mais conhecida do Douro é o seu famoso vinho do Porto, encorpado e adocicado, com um elevado teor alcoólico (normalmente entre 19 e 22% vol.). Este vinho adquire propriedades únicas, não só devido às condições naturais, como o clima e a área onde a fruta é cultivada, mas também graças ao seu processo de produção. A fermentação do mosto (sumo de uva não fermentado) é parada para se adicionar aguardente vínica. É esta interrupção da fermentação que condiciona a doçura do vinho.
Até cerca de 1756, a elaboração dos “vinhos de embarque”, como na época se apelidavam os Vinhos do Porto, seguiam o chamado processo antigo de vinificação. A aguardentação (sempre em pequeno volume) só era realizada depois de terminada a fermentação, obtendo-se assim vinhos mais secos.
No ano de 1820, surge o processo de aguardentação dito moderno, em que se passou a provocar a paragem da fermentação, daí resultando vinhos mais doces. Este processo de elaboração só passa a ser generalizado em 1852, época em que os vinhos começam a se assemelhar aos encontrados hoje em dia.
Há diversas classificações para o Vinho do Porto, que leva em conta seu processo de envelhecimento, procedência da uva, adição de madeira, tempo de envelhecimento, entre outros.
Neste final de semana, faremos o Evento Douro da Confraria Viva o Vinho. Como sempre, será uma oportunidade de provarmos vinhos diferentes e dividirmos com os amigos nossas experiências. Acompanhe em nossa página no Facebook os vídeos que fazemos durante o nosso encontro da Confraria e participe você também: é só abrir a sua garrafa do Douro, postar a foto com seu comentário em nosso grupo no Facebook ou no Instagram, usando a hashtag #EventoDouro. Depois publicamos todas as participações aqui no nosso site. Esperamos por você!