Curioso? Vamos contar aqui um pouco dessa história envolta em mitos e lendas.
O casamento entre Portugal e Inglaterra
A origem do vinho chega a ser tão antiga que existem mesmo Deuses destes néctares, como o grego Baco.
O hábito de consumir vinho em Portugal é igualmente milenar e já Estrabão, um historiador da Grécia Antiga, relatava que era comum beber vinho em toda a Península Ibérica. Mais tarde, a cultura vínica foi reforçada com a chegada dos Romanos ao país, por volta do século II a.C., popularizando o cultivo de vinhas no território nacional, inclusive na região do Douro.
Por sua vez, o vinho do Porto é bem mais atual que isso, mas a sua história tem muito que se lhe diga, num longo percurso de altos e baixos envolto em mitos e lendas.
Baco, por Caravaggio (Fonte: Wikipédia)
Embora não se saiba exatamente qual a data da sua origem, os primeiros vestígios desta bebida surgiram em 1675, como demonstram alguns documentos da época. E, apesar de muita gente acreditar que a criação destas produções é originalmente portuguesa, estima-se que o vinho do Porto nasceu da relação entre Portugal e Inglaterra. Tudo se iniciou quando, no século XVII, os navios provenientes das terras de sua majestade começaram a comprar vinho português e, no seu transporte de volta à Inglaterra, devido à longa distância da viagem, estas bebidas perdiam qualidade, tornando-se necessário encontrar um método de conservação. Para tal efeito, o mérito foi atribuído aos mercadores britânicos que decidiram colocar aguardente no vinho.
D. Manuel Teles da Silva (Fonte: Wikipédia)
Uns anos mais tarde, a colheita tinha mais açúcar concentrado que o normal e, ao adicionar a aguardente como conservação, os vinhos surpreenderam pelo seu sabor, o que fez com que se começasse a inserir álcool no decorrer da fermentação, sendo criado, assim, o vinho do Porto como o conhecemos e admiramos ainda hoje!
Devido a esta estreita relação entre os dois países, foi necessário limitar os direitos de Portugal e Inglaterra sobre o vinho do Porto. Por isso, assinou-se o Tratado de Methuen, no ano de 1703 entre John Methuen e D. Manuel Teles da Silva, um documento que afirmava que os ingleses deveriam comprar vinhos em terras lusitanas e, por sua vez, os portugueses tinham o dever de deixar entrar livremente os tecidos de Inglaterra em território nacional.
Esta relação refletiu-se num impacto positivo para a economia dos países, uma vez que, devido ao prestígio inglês no comércio, o vinho do Porto assumiu a sua força nos mercados internacionais, passando a ser importado por países como Holanda, França e Alemanha.
De facto, o vinho do Porto foi enriquecendo ao longo dos anos e várias figuras emblemáticas fizeram parte do seu crescimento.
Entre elas destacou-se Antónia Adelaide Ferreira, mais conhecida como Ferreirinha, que se dedicou ao cultivo deste vinho e se distinguiu pelas claras inovações que introduziu. Assumindo grande importância nacionalmente, tudo o que englobava o vinho do Porto se tornou lendário.
Desde os barcos rabelo, meio de transporte inicial deste vinho através de 30 a 70 pipas, até às Caves de Vila Nova de Gaia, principal local de armazenamento, o vinho do Porto conquistou a boca dos portugueses e do mundo.
Antónia Adelaide Ferreira (Fonte: Wikipédia)
Barco Rabelo com pipas de vinho, início do século XX (Fonte: Wikipédia)
O que é o vinho do Porto?
Apesar de grande parte dos consumidores de vinho acreditarem que o vinho do Porto é naturalmente doce, é necessário entender que o mesmo é, de facto, um vinho fortificado. Isto quer dizer que é um vinho extremamente licoroso e relativamente alcoólico, distinto pela seu sabor, cor e textura.
O segredo do sabor
Considerado um dos símbolos nacionais e uma referência no universo dos vinhos, as características do vinho do Porto partem imediatamente do terroir em que se insere. Com uma produção exclusiva no Douro e por estar rodeado por montanhas, estes néctares são influenciados pelo seu meio envolvente, incluindo o climático: verões abrasadores e invernos extremamente frios.
Quinta da Leda, Douro (Foto: Viva o Vinho)
Processo da pisa a pé (Foto: Churchill’s)
Sem sombra de dúvidas, o vinho do Porto é o exemplo perfeito de um vinho fortificado. Porém, existe uma abrangente diversidade destes vinhos, capazes de surpreender até os paladares mais tímidos. E, apesar dos vinhos do Porto tintos serem mais comuns e populares, também existem opções brancas de fazer chorar por mais.
Dessa maneira, são utilizadas várias castas na produção destes néctares, entre as quais as tintas Tinta Roriz, Touriga Nacional, Touriga Franca, Tinta Barroca e Tinta Cão, e as brancas Malvasia Fina, Donzelinho e Rabigato.
Devido à sua variedade e para melhor compreender a sua categorização, os vinhos do Porto são divididos em duas grandes famílias, a Ruby e a Tawny.
Os vinhos Ruby possuem menor oxidação devido ao pouco contacto com ar nas barricas e, por isso, têm um sabor que remete mais a frutas. Além do mais, a sua cor rubi é realmente distinta da maioria das produções nacionais. Dentro desta família os vinhos mais populares são o Ruby, uma produção mais jovem e sem evolução quando engarrafado, e o rosé, uma novidade que resulta de um processo de maceração mais fraco. Aqui também pode encontrar o emblemático Late Bottled Vintage — distinto por partir de uma colheita de apenas um ano —, e o Vintage, considerado o símbolo máximo dos vinhos do Porto.
Por outro lado, a família Tawny já possui um nível de oxidação bastante superior e, por isso, os aromas frutados são substituídos por madeira e especiarias. Aqui podem ser distinguidos o Tawny Reserva, que passa cerca de 6 anos em barrica, e os Colheita, provenientes de uma única colheita e que envelhecem no mínimo 7 anos. Somam-se ainda os Tawnys de 10, 20, 30 e 40 anos que, como o nome diz, envelhecem em média esse mesmo número de anos em barrica.
Por fim, os brancos também são incluídos nesta lista, destacando-se o Branco Seco, que permanece com um certo nível de doçura, e o Colheita Branco, cujas uvas foram colhidas de uma só vez e são alvo de um longo processo de envelhecimento. Efetivamente, estes vinhos não são tão produzidos como os restantes, o que se refletiu positivamente na elevada procura.
Mercado em permanente ascensão
O vinho do Porto encontra-se presente em cerca de 120 mercados ao redor do mundo, facto que faz crescer esta produção e contribui para a economia portuguesa de forma clara. Contudo, entre 2011 e 2018 as exportações não cresceram significativamente, números contornados pelos dados de 2019.
O ano de 2019 foi marcado pela faturação de cerca de 305 milhões de euros, o que se reflete na exportação de cerca de 81 milhões de garrafas de vinho do Porto. Entre os principais mercados de exportação destacaram-se Holanda, Estados Unidos, Alemanha, Dinamarca, Espanha e, principalmente, Brasil, que importou mais 12,7% por comparação a 2018. A França surpreendeu por diminuir as suas exportações, assim como a Bélgica e o Canadá.
Entre os principais motivos desta tendência positiva destaca-se o turismo, já que grande parte dos turistas que chegam ao distrito do Porto são imediatamente cativados por estes néctares tão singulares. Prova disso são as visitas às caves do vinho do Porto que, segundo a Associação de Empresas do Vinho do Porto e Douro (AEVP), em 2017 receberam cerca de 1,4 milhões de turistas que gastaram entre 10 e 20 euros por visita.
Envelhecimento do vinho do Porto em pipas na adega da Taylor’s (Fonte: Wikipédia)
Um vinho sinónimo de conhecimento
Capaz de maravilhar os locais e de fazer as delícias de turistas, o vinho do Porto representa um grande símbolo para o turismo e cultura da região. Com isso, vários projetos têm sido criados de maneira a dar não só a conhecer, mas também a provar a história deste vinho.
O Museu do Vinho do Porto destaca-se neste panorama e, inaugurado o seu mais recente local em 2019, o principal objetivo deste espaço passa por contar o percurso do vinho do Porto através de quatro etapas, retratadas entre pinturas e coleções. O Museu conta também com um wine bar com vista privilegiada para o rio.
Para além do mais, o processo de produção deste vinho exige cada vez mais qualificações e um conhecimento irrepreensível do setor, o que torna necessária a criação de formações especialmente dedicadas à temática. Por isso, o Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto desenvolveu formações destinadas a profissionais da área que desejam incrementar as suas habilidades através de uma componente teórica e prática. Assim, no curso Certified Port Educator vão desenvolver competências como certificações e fiscalizações, harmonização e como fazer blends e cocktails.
Dia Internacional do Vinho do Porto
Quinta da Leda, Douro (Foto: Viva o Vinho)
Criada pelo Center for Wine Origins em 2012, esta iniciativa marca a sua presença desde então e, por isso, o Viva o Vinho convida-o a deliciar-se com um copo de vinho do Porto enquanto procura descobrir mais sobre estes néctares.